Obra Cativa para exposição A Arte Delas

Se tivesse terminado a obra da casa não teria iniciado a obra de arte.

Há vinte anos atrás, iniciei meu caminho nas artes plásticas e por receio de não conseguir ter uma vida estável, parti para outros caminhos. O tempo passou. Muito trabalho, filhos, separação e novo casamento. Comprei uma casa e iniciei uma obra. A crise financeira foi se aproximando e tive que me mudar para a obra que acabou pela metade. A instabilidade descascou os meus sonhos, mas me aproximou do meu desejo: precisava retomar a trilha das artes visuais. Estava sem dinheiro e comecei a estudar modelagem, achando que poderia criar roupas para vender e custear meu trabalho com arte, porém, quando percebi, estava modelando a árvore do meu quintal no lugar de um corpo humano. Pois bem, essa árvore me enlouquece soltando uma quantidade infernal de folhas que precisam ser varridas todos os dias para que a casa não pareça uma casa abandonada!

Mas, essa mesma árvore me abriu o caminho de volta a arte. Comecei a catar suas folhas a devolvê-las à árvore através de alfinetes.

Lacan falou, a propósito do processo de individuação do sujeito, que "se uma árvore pintasse, seria deixando cair suas folhas". É isso, nós somos feitos de perdas e é a partir delas, que nos movimentamos pela vida.

Ano passado, participei de uma exposição de uma galeria carioca aberta a qualquer artista que desejasse. Um curador interessou-se e vem me indicando para algumas exposições. Porém, não há verba nem cachês para os artistas. Infelizmente é a realidade de nosso país. O recente convite é para a exposição Arte Delas - Arte Monumental na Marina da Glória. O meu projeto se chama Cativa e para eu realizá-lo, são necessárias em torno de 20 mil folhas catadas, costuradas uma a uma. Apesar de o custo material ser insignificante, o custo operacional, para mim é alto, pois preciso da colaboração remunerada de catadores e costureiras, além do transporte e da logística de toda a produção. São 32 sacos de 100 litros cheios de folhas cônicas  que depois precisarão ser costuradas. Tudo isso em pouco tempo.

Para finalizar, acredito que a força desta obra esteja na sua micropolítica, no seu poder de sensibilização para o que aparentemente não tem valor e para o que se pode fazer com isto.

Ao resto, agradeço!

Assim, se tivesse terminado a obra da casa, não teria iniciado a obra de arte.

Serviço:

• Arte Monumental - A Arte Delas
• Onde: Marina da Glória, Rio de Janeiro
• Quando: De 24 de novembro a 24 de Janeiro de 2019